segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Artigo: A base de cálculo do Adicional de Insalubridade



Artigo: A base de cálculo do adicional de insalubridade


Artigo escrito por Thiago Loures M. M. Monteiro, advogado inscrito na OAB-MG pelo nº 146.402.

1-      Conceito do Adicional de Insalubridade

Não obstante todos os avanços tecnológicos, o trabalho humano é indispensável em nossa sociedade, sendo que algumas atividades se destacam pelo perigo que geram para a vida, a segurança e a saúde do trabalhador.

O adicional de insalubridade é um acréscimo ao salário do trabalhador, que labora exposto a agentes insalubres, ou em condições insalubres. Sendo que o adicional pode ser em nível mínimo, médio ou máximo.

Nas palavras de Alice Monteiro de Barros (1), se compreende de forma clara este conceito:

O trabalho em condições insalubres, ainda que intermitente (Súmula n. 47 do TST), envolve maior perigo para a saúde do trabalhador e, por isso mesmo, ocasiona um aumento na remuneração do empregado. Em conseqüência, o trabalho nessas condições, acima dos limites de tolerância estabelecidos pelo Ministério do Trabalho, assegura ao empregado o direito ao recebimento de um adicional, de 10%, 20% ou 40% sobre o salário mínimo, ou mínimo profissional, conforme se classifique a insalubridade, respectivamente, no grau mínimo, médio ou máximo, segundo apurado por perito, médico ou engenheiro do trabalho registrado no Ministério do Trabalho.

Para definir quais são aos agentes insalubres, as condições insalubres, bem como o nível do respectivo adicional, o Ministério do Trabalho elabora Normas Regulamentadoras, como Norma Regulamentadora nº 15, também conhecida como NR-15. 

Importante ressaltar que a própria CLT, prevê em seu artigo 191, ser possível a eliminação ou neutralização da insalubridade, sendo que nestes casos o adicional não será devido. Tal situação pode ocorrer, por exemplo, com a utilização de Equipamentos de Proteção Individual- EPI, que neutralizem os possíveis efeitos dos agentes ou condições insalubres.

 Sergio Pinto Martins (2) critica o adicional de insalubridade, ao perceber que os empregadores calculam se vale a pena pagar um pouco mais, para expor a segurança e saúde de um trabalhador:

O ideal é que o empregado não tivesse que trabalhar em condições de insalubridade, que lhe são prejudiciais a sua saúde. Para o empregador, muitas vezes é melhor pagar o ínfimo adicional de insalubridade do que eliminar o elemento nocivo à saúde do trabalhador, que demanda incentivos. O empregado, para ganhar algo a mais do que seu minguado salário, sujeita-se a trabalhar em local insalubre.

2-      Base de cálculo prevista na CLT
O artigo 192 da CLT, com redação dada pela Lei nº 6.514 de 1977, prevê taxativamente que o adicional de insalubridade, seja em que grau for, irá incidir sobre o salário mínimo, e não sobre a remuneração do empregado.

Importante ressaltar que o referido dispositivo é de 1977, ou seja, anterior a promulgação de nossa Constituição Federal. 

Art . 192 - O exercício de trabalho em condições insalubres, acima dos limites de tolerância estabelecidos pelo Ministério do Trabalho, assegura a percepção de adicional respectivamente de 40% (quarenta por cento), 20% (vinte por cento) e 10% (dez por cento) do salário-mínimo da região, segundo se classifiquem nos graus máximo, médio e mínimo. 

3-      Vedação Constitucional 

A Constituição Federal, promulgada em 5 de outubro de 1988, em seu artigo 7º inciso IV, garante aos trabalhadores o direito ao salário mínimo, sendo vedada sua vinculação como índice ou base de cálculo.
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
IV - salário mínimo , fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim;

Por um raciocínio técnico legislativo, a Constituição Federal não recepcionou o artigo 192 da CLT, no que tange a utilização do salário-mínimo como base de cálculo do adicional de insalubridade. Neste sentido, em 2008, o Supremo Tribunal Federal editou a súmula vinculante nº 4:

SALVO NOS CASOS PREVISTOS NA CONSTITUIÇÃO, O SALÁRIO MÍNIMO NÃO PODE SER USADO COMO INDEXADOR DE BASE DE CÁLCULO DE VANTAGEM DE SERVIDOR PÚBLICO OU DE EMPREGADO, NEM SER SUBSTITUÍDO POR DECISÃO JUDICIAL.

4-      Interpretação dos Tribunais Superiores

Diante deste conflito normativo, surgiram enormes discussões sobre qual seria a base de cálculo do adicional de insalubridade.

De um lado, os que defendem a utilização da remuneração do trabalhador como base de cálculo, já que a Constituição proíbe a utilização do salário mínimo, e a norma trabalhista deve ser interpretada na defesa dos direitos do trabalhador. Destacando a inconstitucionalidade do artigo 192 da CLT.

De outro lado, os que defendem a manutenção do salário mínimo como base de cálculo, em respeito ao Princípio da Legalidade, uma vez que não existe lei prevendo base de calculo diversa ao salário mínimo, e segundo artigo 5º inciso II da Constituição Federal, ninguém pode ser obrigado a fazer ou deixar de fazer, senão em virtude de lei.

Após muita polêmica, foi redigida a súmula 228 do TST, a qual garantia a permanência do salário mínimo, como base de cálculo do adicional de insalubridade.

Conforme dito anteriormente, em 2008 o Supremo Tribunal Federal dispôs na súmula vinculante nº 4, que é absolutamente vedada a utilização do salário mínimo, como base de cálculo de qualquer vantagem ao empregado.

Diante de tal enunciado, o Tribunal Superior do Trabalho ainda em 2008, alterou a Súmula 228, que passou a indicar o salário básico do trabalhador, como base de cálculo.

Contudo, ao editar tal enunciado o Tribunal Superior do Trabalho criou obrigação que não era prevista em lei, ou seja, contrariou claramente o Princípio da Legalidade, esculpido no artigo 5º inciso II, da Constituição Federal.

 E em razão disto, em 2009, o Supremo Tribunal Federal suspendeu liminarmente a nova redação da súmula 228 do TST, na reclamação constitucional nº 6.266-0. E o STF ainda afirmou que conforme ficou decidido no RE 565714/Sp, não é possível que o judiciário substitua o salário mínimo como indexador, antes da edição de lei que o faça.

Dessa forma, atualmente o Tribunal Superior do Trabalho considera válida a utilização do salário mínimo como base de cálculo, mesmo reconhecendo sua inconstitucionalidade:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. BASE DE CÁLCULO DO ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. SÚMULA VINCULANTE 4 DO STF. SUSPENSÃO LIMINAR DA SÚMULA 228 DO TST.Nos termos do r. despacho do e. Presidente do excelso Pretório, fixando a inteligência do julgamento que ensejou a edição da Súmula Vinculante nº 4, "o adicional de insalubridade deve continuar sendo calculado com base no salário mínimo, enquanto não superada a inconstitucionalidade do art. 192 da CLT por meio de lei ou convenção coletiva" (R-6266-DF). Precedentes deste c. Tribunal. Agravo de instrumento a que se nega provimento. TST- AIRR 706007120085120013 70600-71.2008.5.12.0013- Relator: Alexandre de Souza Agra Belmonte- Julgamento: 26/06/2013.


AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. BASE DE CÁLCULO DO ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. Agravo de instrumento a que se dá provimento, para determinar o processamento do recurso de revista, visto que demonstrada possível contrariedade à Súmula Vinculante nº 4 do STF. RECURSO DE REVISTA. BASE DE CÁLCULO DO ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. O Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o RE-565.714-SP, sob o manto da repercussão geral da questão constitucional, referente à base de cálculo do adicional de insalubridade, editou a Súmula Vinculante nº 4, reconhecendo a inconstitucionalidade da utilização do salário mínimo como parâmetro, mas vedando a substituição deste por decisão judicial. Assim decidindo, a Suprema Corte adotou técnica decisória conhecida, no direito constitucional alemão, como -declaração de inconstitucionalidade sem pronúncia da nulidade-, ou seja, a norma, não obstante ser declarada inconstitucional, continua a reger as relações obrigacionais, em face da impossibilidade de o Poder Judiciário substituir o legislador, a fim de definir critério diverso para a regulação da matéria. Portanto, ainda que reconhecida a inconstitucionalidade do artigo 192 da CLT, tem-se que a parte final da Súmula Vinculante nº 4 do STF não permite criar critério novo por decisão judicial, razão pela qual, até que se edite norma legal ou convencional estabelecendo base de cálculo, para o adicional de insalubridade, distinta do salário mínimo, continuará a ser aplicado esse critério para o cálculo do referido adicional. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento.(TST - RR: 12760920115080010  1276-09.2011.5.08.0010, Relator: Valdir Florindo, Data de Julgamento: 19/06/2013, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 21/06/2013)

Tal situação é uma verdadeira aberração jurídica. Dois Tribunais Superiores verificam uma inconstitucionalidade e uma inércia absurda do Poder Legislativo, e optam por uma solução confortável: reconhecer a inconstitucionalidade de uma norma, mas manter a mesma válida, até o dia em que o Poder Legislativo queira fazer a sua obrigação, qual seja, LEGISLAR!

Fato é que em um Estado Democrático de Direito, é preciso mais do que sensação de segurança jurídica, mas sim segurança jurídica de fato, pautada no Princípio da Legalidade e na Supremacia da Constituição.

5-      Conclusão

Portanto, a base de cálculo do adicional de insalubridade se mostra um tema de extrema relevância, que pode se perder dos tribunais, pois os operadores do direito se convencem que um determinado enunciado está certo, simplesmente porque foi proferido por um determinado Tribunal.

Conforme demonstrado no presente artigo, cabe discussão jurídica profunda, tanto aos que defendem a incidência do adicional sobre o salário mínimo, quanto aos que defendem ser a base de cálculo a remuneração ou o salário básico.

A solução para tal impasse só se resolveria com o Poder Legislativo fazendo uma lei para abordar o assunto, o tema é de fato polêmico, e a repercussão financeira talvez seja incomensurável, mas a Constituição foi promulgada em 1988, e a mais de duas décadas existe este conflito do artigo 192 da CLT com a Constituição Federal, e o Legislativo se mantém confortavelmente inerte!

No meu entendimento, sob o prisma matemático, se a base de cálculo do adicional de insalubridade não pode ser o salário mínimo, e o Judiciário não pode criar outro parâmetro de cálculo, não havendo base de cálculo, todos os adicionais de insalubridade deveriam ser zerados.

Isto faria com que a população fosse às ruas, e com absoluta certeza o Poder Legislativo discutiria e elaboraria uma lei sobre o tema, em tempo recorde, respeitando a Constituição e garantindo a manutenção do adicional de insalubridade.

Mas este processo consistiria em acordar a população, para lutar pelos seus interesses, fazendo com que os três poderes trabalhassem de forma rápida e com qualidade, o que infelizmente seria democracia demais, para o nosso Estado Aparentemente Democrático de Direito.   
  
6-      Referencias Bibliográficas

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 3. Ed. Ver. E amp. São Paulo, LTR, 2007. Página 767.
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 25 ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 644
TST- AIRR 706007120085120013 70600-71.2008.5.12.0013- Relator: Alexandre de Souza Agra Belmonte- Julgamento: 26/06/2013.
TST - RR: 12760920115080010  1276-09.2011.5.08.0010, Relator: Valdir Florindo, Data de Julgamento: 19/06/2013, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 21/06/2013